quinta-feira, dezembro 30, 2010

DERREPENTE SEM (PARTE4)


LIVRO, DERREPENTE SEM
CAPITULO 3
DE SORRISOS ARTIFICIAIS, FRIOS AEROPORTOS E A PRIMEIRA VEZ

Sozinho no aeroporto de Brasília depois de resolvido  todas as questões burocráticas pré-embarque e da Any e o David terem repassado inúmeras vezes os procedimentos para o embarque e desembarque em Paris e Bucareste. Marcos agora depois de tantas viagens, de tantas vezes ter embarcado e desembarcado em vários aeroportos e de ter conhecido outras tantas empresas aéreas onde foi muito bem recebido como quando viajava pela TACV de Cabo Verde e pelos inúmeros problemas causados por preconceito racista quando viajava pela empresa TAP portuguesa por exemplo. Marcos envolto a todas essas lembranças, recordara de uma em especial, a sua primeira viagem aérea que ao contrário da atual foi marcante pelo contexto de felicidade que envolvia sua estréia em um avião, pois estava viajando com passagem só de ida para Cabo Verde onde iria morar com Júlio que já estava à seis meses naquele país a trabalho para o Estado brasileiro, o recém atleta lembrara como estava ansioso por chegar em Cabo Verde, a diferença é que naquele momento Marcos também estava apreensivo com a novidade, mas naquela ocasião tudo soava bem, todos estavam felizes por Marcos e Júlio, Marquinhos estava especialmente feliz porque aquela viagem selava seu casamento com Júlio. Neste momento ao lembrar do casamento Marcos retomou a consciência atual e a tristeza dos últimos dias é novamente estampado em seu rosto. Marcos tentou imaginar qual é a real situação de Jú, tentou imaginá-lo como dá última vez que o viu, isso em abril, nas férias de Júlio, mas ele fez um sinal negativo ao lembrar, pois quando viu seu companheiro a situação já não era das melhores, Júlio chegou ao Brasil extremamente magro e com a aparência envelhecida causada por uma forte anemia e a depressão, Júlio não gostava do país em que estava vivendo e isso refletiu drasticamente em sua saúde, além do fato que era fumante desde os 18 anos, este foi um fato que contribuiu muito para o agravamento da sua saúde. Marcos sentara com o pensamento longe e aguardara o chamado para embarcar para o Rio de Janeiro, de onde faria escala para Paris.
Vinte minutos após Marcos ter entrado na sala de embarque, pelo auto-falante foi anunciado o início do embarque para o Rio de Janeiro, para o agrado dos passageiros o avião estava relativamente vazio, fato que fez com que Marcos ocupasse outro conjunto de cadeiras desocupadas e assim, pudesse deitar e tentar dormir até o destino, mas seu pensamento o levou a continuar as lembranças do seu primeiro vôo em 2003, Marcos recordara que naquela época Júlio o orientara a colocar algumas roupas em sua bagagem de mão na viagem para Cabo Verde porque as malas dos passageiros costumavam demorar a chegar na ilha de Santiago, pois ficavam retidas na ilha do Sal até serem embarcadas. No entanto, Marcos ignorara as orientações do Jú e ao chegar a ilha do Sal pensando que iria fazer escala imediatamente, para sua surpresa, deparou-se com Júlio e seu famoso sorriso largo e receptivo, Jú havia preparado uma surpresa, foi para a ilha do Sal, mudara as datas do vôo do Marcos e ali decretara um final de semana a SÓS, mas as surpresas não pararam ali porque o sorridente companheiro de Marcos reservara uma suíte em um hotel que imitava um navio em seu designer e ficava parte dentro do mar, fora de fato, um final de semana inesquecível, outra coisa que Jú fazia com maestria, preparar surpresas. Marcos acabara por dormir, aproveitando que estava sonolento, recusara o lanche oferecido no avião para não despertar aquela que julgou ser uma oportunidade de apagar de tudo a sua volta, naquele momento, dormir para ele era como um milagre. Alguns minutos depois apagou.
Marcos acordara com um rosto branco com um sorriso artificial mirando-o, era a comissária de bordo numa educação treinada informando que o avião aterrissaria em poucos minutos, era preciso se preparar, ou seja, sentar-se, colocar a poltrona em posição vertical, colocar e ajustar o sinto de segurança. Marcos retribuiu o sorriso artificial com outro igual e seguiu as instruções, colocou imediatamente o fone de ouvido oferecido pela comissária de bordo ao entrar no avião, queria ouvir se estava passando na radio interna a música “Samba do avião” relatado por alguns amigos que isso era um costume dos vôos que faziam aquela rota, mas parece que, ou não era costume daquela empresa aérea, ou não lembrara deste detalhe.
Marcos olhara pela janela e viu o mar, pelo menos aquela parte ainda era azul, o passageiro com destino à Bucareste lembrara de sua amiga caboverdiana que morava e estudava no Rio de Janeiro. Ele ficou com vontade de revê-la, queria contar tudo o que aconteceu e relatar seus últimos dias. Sua amiga Ley foi a primeira amizade que Marcos fez em Cabo Verde, sua amiga caboverdiana participou de um dos melhores momentos de sua vida e tornara uma confidente em comum de Marcos e Júlio, em Cabo Verde fez parte da companhia de teatro que o Marcos criou naquele país e chegou a morar com o casal até ir para o Rio de Janeiro estudar psicologia, eles nunca perderam o contato e agora Marcos queria revê-la, mas ele não conhecia o Rio de Janeiro e o tempo de estada naquele aeroporto seria muito curto para se aventurar.
Quando o avião aterrissou, Marcos preocupou-se em comprar um livro, pois, seriam 12 horas de vôo ininterruptas até Paris e em seguida, mais 4 horas até Bucareste. O solitário viajante precisava ter algo para fazer ou consumiria em tristeza fechado dentro do avião tendo como opção, apenas lembrar da tristeza que o acompanhava naquela triste e esperançosa viagem. Lembrara que tinha que comprar também, recargas para o telefone celular, recomendações da Any que queria notícias no decorrer da viagem. Ao entrar na livraria deparou-se diante de uma montanha de Best Sellers estampado nas capas dos livros disponíveis que em nada tinha em comum com o que Marcos estava acostumado, com a falta de opção, acabou escolhendo um romance cujo a história já havia sido adaptado para o cinema, assim, ele poderia depois assistir e fazer os contra-pontos, uma mania que Marcos cultivara, ler obras que poderia depois assistir, seja no teatro, ou no cinema e perceber como os diretores visualizaram a obra. No entanto, costumava se decepcionar, pois no cinema, percebia que não havia um compromisso com a história e sim, de apoiar no sucesso do romance para vender um filme quase que distinto.  Tendo a obra literária em mãos, Marcos foi até a saída do saguão do aeroporto numa tentativa de ver algo da cidade alardeada como maravilhosa, mas para sua decepção, aquele aeroporto era como a maioria, distante e frio, Marcos sempre dizia que aeroporto é um lugar neutro, não é pais nem estrangeiro é apenas, aeroporto, como ele dizia – Se ha um lugar neutro, este lugar é o aeroporto! O Viajante mais uma vez lembrou de sua amiga Ley, tão perto e ao mesmo tempo tão distante, tantas vezes tentou marcar um encontro com a amiga para visitá-la e agora estava próximo, mas as circunstancias não permitia tal encontro.
Parado diante do comissário que preparava seu check-in, Marcos não acreditou quando o mesmo sorriu e ofereceu duas noites em um hotel 5 estrelas por conta da empresa, era uma estratégia de marketing, Marcos era turista com passagens para Romênia com escala em Paris, era o cliente que preenchia o perfil da rede hoteleira, a verdade é que  Marcos parou olhando para o comissário sem reação, era tudo o que ele queria, uma oportunidade de sair do aeroporto e encontrar com sua amiga Ley, mas o motivo de sua viagem recaiu sobre sua mente, não estava ali como turista em férias, tinha que buscar Ju para se tratar no Brasil e isso era prioridade, era aquele o motivo de deixar o Brasil em meio a faculdade e trabalho. 40 minutos depois de recusar a oferta tentadora da empresa hoteleira, Marquinhos estava tentando persuadir o guarda responsável pela fiscalização da esteira com scanner, pois em sua bagagem de mão haviam frascos de perfume, creme de barbear, desodorante e outros vários produtos de higiene e beleza que foram retidos, não puderam sair do país. O viajante ficou com uma certa raiva, lamentou segundo ele que as neuroses Estadunidense e Européia afetasse o seu país. Imaginou que fez muito bem em não obedecer as ordens do Ju quando foi para Cabo Verde, afinal, para quê encher uma mala de bagagem de mão? Para acabar dando de presente para um guarda qualquer? Pois ele duvidou que seus produtos chegassem até ao destino burocrático.